Ordinariado Militar do Brasil

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Carta circular aos capelães militares e diáconos permanentes do OMB

Prot. N. 0612/19 GAM

CARTA CIRCULAR
AOS CAPELÃES MILITARES E DIÁCONOS PERMANENTES
DO ORDINARIADO MILITAR DO BRASIL

– Sobre as medidas de defesa dos menores e adolescentes e apelo à santidade dos clérigos —

Prezados Capelães Militares e Diáconos Permanentes de nossa Igreja castrense, Saúde, paz e bênção no Senhor!

No domingo 24 de fevereiro de 2019, o Papa Francisco encerrou, durante a celebração do Santo Sacrifício da Missa no Vaticano, o encontro com as Conferências Episcopais do mundo, por ele convocadas, para estudar o flagelo dos abusos sexuais sobre menores e adolescentes, perpetrados por membros do clero católico. A sua homilia, dolorosa e penetrante, deve ser objeto de estudo, análise e meditação por parte de todos nós, ministros da Igreja, em seu apelo à santidade clerical, em seu forte convite à conversão pessoal, bem como em sua decisão de aplicar todas as medidas necessárias à tutela de nossos irmãos mais indefesos.

Como Pastor da Igreja Castrense no Brasil e enquanto aguardo ulteriores determinações normativas por parte da Santa Sé, quero unir-me imediatamente à preocupação e às indicações do Papa Francisco, dirigindo-me ao meu clero, no exercício de meu ministério episcopal. Enviolhes, em anexo, o texto da homilia pronunciada pelo papa Francisco, estabelecendo que ele seja objeto de atento exame e de profunda meditação e oração durante os próximos dias.

Com o passar do tempo e o evoluir da compreensão deste lamentável fenômeno, torna-se sempre mais evidente a trágica situação do clérigo abusador, um homem de Deus que, como diz o Papa Francisco, torna-se instrumento de satanás, de santificador a algoz, de diretor espiritual a destruidor do ser de nossos menores e de nossos jovens. Seu ato pecaminoso não prejudica apenas a ele mesmo; o seu indigno comportamento fere profundamente o menor ou jovem abusado, marcando-o negativamente para o resto de sua existência. É de se considerar também que o mal causado para sempre no corpo e na alma da pessoa que sofreu tais abusos torna-se, para a Igreja, um estigma do qual dificilmente ela se livrará e do qual ela deverá dar severas contas a Deus, juntamente com o abusador.

Notem, queridos padres e diáconos, que a figura daquele que, chamado por Deus, é marcado pelo caráter do Sacramento da Ordem, torna-se definitivamente uma figura pública, imagem sacramental do Cristo Servidor (os diáconos) ou do Cristo Cabeça e Pastor da Igreja (os padres e bispos, cada qual em sua respectiva responsabilidade eclesial). Após a ordenação sagrada, nunca mais existirá uma área “privada” ou “particular” em sua existência, tudo passa a ser marcado pelo caráter sacramental e em todos os momentos e em todas as circunstâncias, o ordenado é, deve ser e precisa apresentar-se sempre, um homem de Deus, a serviço da santificação de todos. Imagem sacramental de Cristo; pensem nisso, queridos padres e diáconos!

Além das causas já estudadas e apresentadas no encontro romano, pergunto-me se este abominável fenômeno na Igreja não tem ligações também com o progressivo obscurecimento da mais autêntica espiritualidade presbiteral, desenvolvida ao longo dos séculos na história da Igreja e que produziu belíssimas figuras de sacerdotes santos, dos primeiros séculos até os nossos dias. Reduzida a vida sacerdotal a uma mera prestação de serviços externos, perdida a dimensão espiritual do sacerdócio, cai-se em uma rotina profissional que não abre espaço à graça santificante e transformadora de nosso ser de consagrados no ministério. Abrem-se as portas a comportamentos mundanos, negligencia-se a ascese que educa nossos sentimentos e modera nossas paixões. O clérigo abandona a vida de oração, torna-se celebrador mecânico da Santa Eucaristia e não mais “hóstia com a Hóstia imolada” pela salvação do mundo. O coração, que deveria abrasar-se de amor por Deus e pela Igreja, torna-se “terra de ninguém” e acaba enlameado por paixões que nunca se contentam a si mesmas e levam sempre para mais baixo, para os níveis mais ínfimos que um ser humano pode atingir, como é, entre outros, o do abuso de menores.

Meus padres e diáconos, na próxima semana iniciaremos a quaresma. Que ela seja um tempo forte para reanimarmos em nós o que recebemos pela imposição das mãos do bispo que nos ordenou, há quarenta, trinta, vinte, dez anos atrás ou até menos. Vale a pena reavivar esta chama, da qual depende a nossa salvação eterna e a salvação daqueles que Deus nos confiou! Aproveitemos o tempo da quaresma para aprofundarmos, na leitura e na oração, alguns documentos básicos para a nossa vida sacerdotal: o documento Lumen Gentium, do Concílio Ecumênico Vaticano II, o decreto conciliar Presbyterorum ordinis, o Diretório para o Ministério e a Vida dos Presbíteros, da Congregação para o Clero. Intensifiquemos a nossa vida de oração, pela celebração diária do Santo Sacrifício da Missa, a recitação atenta da Liturgia das Horas como oração de toda a Igreja, e o rosário de Nossa Senhora. Vivamos o nosso celibato e castidade sacerdotal como expressão de uma doação de amor total e irreversível a Cristo pela salvação da humanidade. Abracemos, com generosidade, um programa de conversão que revigore nosso sentido mais profundo como homens de Deus, como homens da Igreja, a serviço de todos.

Enquanto a Santa Sé não apresentar uma normativa específica, proveniente deste recente encontro, recordo aos nossos padres e diáconos algumas recomendações.

  1. Para a tutela dos menores e adolescentes de nossas Capelanias Militares, estão em vigor todas as normas civis, militares e eclesiásticas já existentes, e elas devem ser rigorosamente aplicadas, em todas as circunstâncias. Exige-se extrema prudência nesse campo.
  2. Qualquer comportamento, nesse campo, por parte de nossos padres e diáconos, que não corresponda às exigências da ética, da moral e da disciplina eclesiástica desde que devidamente comprovado por provas consistentes, desde, será imediatamente encaminhado às várias instâncias civis, militares e eclesiásticas, para as medidas necessárias.
  3. Além disso, considerada a grave obrigação de dar testemunho público que incumbe sobre os ministros ordenados, qualquer outro comportamento de um clérigo de nosso Ordinariado Militar, que viole séria ou gravemente as normas e a disciplina eclesiástica vigentes, será objeto imediato de averiguação e consequente tomada de firme posição por parte do Arcebispo Militar, com a imposição das medidas canônicas cabíveis e comunicação à autoridade militar competente.
  4. Em qualquer circunstância e para todo tipo de comportamento que viole o decoro sacerdotal, a minha posição será sempre a de “tolerância zero”, como recomendado pelo Papa Francisco.

Levemos para a nossa quaresma a severa advertência de Jesus: “É inevitável que ocorram escândalos, mais ai daquele que os provoca! Seria melhor para ele ser atirado ao mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço, do que fazer cair um só desses pequenos” (LC 17, 1-2; cf Mt 18, 6-7).

Uma santa Quaresma para todos. Com minha benção.

Brasília, DF, 26 de fevereiro de 2019.

Dom Fernando Guimarães
Arcebispo Ordinário Militar do Brasil

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>> Leia aqui a íntegra do discurso do Papa Francisco no final da concelebração eucarística <<

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