Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
Estamos celebrando o XXII domingo do Tempo Comum. No Brasil, a proposta de setembro é voltada para a o mês da Bíblia. A Palavra de Deus deste Domingo chama atenção para o modo como o cristão deve viver sua prática religiosa: com sinceridade diante de Deus, humildade e amor para com os outros e não de forma legalista, fria e autossuficiente. Com efeito, Jesus critica duramente os escribas e fariseus, que vieram de Jerusalém para observá-lo e questioná-lo. Somos convidados para a celebração da Eucaristia e não meros cumpridores de um dever religioso. Deus, que nos convida, quer nossa participação no Mistério de Jesus Cristo, Pão vivo, descido dos céus para ser nosso remédio e alimento de vida eterna.
Na primeira leitura – Dt 4,1-2.6-8 – os Mandamentos de Deus não são um capricho divino para provar a fidelidade humana, mas um caminho insubstituível para o Reino de Deus e para a vida eterna. O zelo dos fariseus e dos escribas eram tais e com uma mentalidade de tanto apego à letra pela letra, que se tornaram extremamente legalistas. Eles diziam: “Façamos uma cerca em torno da Lei”, ou seja, criaram pouco a pouco um número enorme de preceitos para evitar qualquer desobediência, ao menos remota, à lei. Preceitos humanos que foram obscurecendo a pureza da lei de Deus e sua característica de ser sinal de amor.
Na segunda leitura – Tg 1,17-18.21-22b.27 – não é suficiente rezar, é preciso agir, pois a fé e a oração sem as obras são mortas. A Religião pura e sem mancha diante de Deus Pai é esta: Assistir os órfãos, e as viúvas em suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo! São Tiago combate a falsa religião: “Sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes, enganando-vos a vos mesmos!” (Tg 1, 22) A religião de aparências não salva! É enganação, apenas isso! O carro não anda com falso combustível – por exemplo, água! Enferruja e não sai do chão! Numa outra passagem, o Apóstolo Tiago afirma que a Fé sem as obras e morta (Tg 2,17). A Fé não é um produto de beleza, mas uma energia divina, necessária para praticar boas obras. Quem crê em Jesus deve viver como Jesus!
Jesus censura também os escribas e fariseus pela incapacidade de distinguir entre o essencial e o secundário; em discernir o que vem Deus e o que é meramente prática e tradição humanas, talvez boas e louváveis, mas não essenciais. Em matéria de religião, nem tudo tem igual valor, nem tudo tem a mesma importância. A medida de tudo é o amor: o amor é a plenitude da lei (Rm 13,10); só o amor dá sentido a todas as coisas!
No Evangelho – Mc 7,1-8. 14-15. 21-23 – Jesus veio ao mundo para salvar a todos e procurar adoradores em espírito e verdade (Jo 4,23). A Religião de Jesus bate direto no coração do ser humano. Jesus chama os fariseus de “hipócritas”. É um conceito próprio de teatro em que o artista representa um personagem diferente de si mesmo. Ele representa um personagem diferente de si mesmo, realmente diferente. Os fariseus gostavam de aparecer bons! E, não obstante, eram maus! Eram como sepulcros caiados que é mais importante: ter as mãos limpas, mas o coração era iníquo! O profeta afirmava: Este povo honra-me com seus lábios, mas seu coração está bem longe. Jesus não gosta de aparências enganosas! Jesus favorece sempre o lado humano: Que é mais importante, comer os grãos de trigo com as mãos limpas ou saciar os famintos, realizar um culto solene muitas vezes barulhento ou socorrer um menino abandonado?
Os Mandamentos, prescritos por Deus, são simples e claros; não vamos torná-los difíceis mediante acréscimos devocionais que pouco ou nada têm a ver com os Mandamentos do Senhor! Jesus convida a ir ao essencial: vigiar as intenções e atitudes do nosso coração, pois “o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior” (Evangelho). Com um coração puro, poderemos reconhecer que tudo de bom que temos é dom de Deus (“Todo dom precioso e toda dádiva perfeita vêm do alto; descem do Pai das luzes!” – 2a. leitura) e que, diante dele, somos sempre pobres e pecadores, necessitados de sua misericórdia. Isto nos abre de verdade para o amor aos outros e para a compaixão: somos todos pobres diante de Deus.
Vivamos, assim, intensamente o Mês da Bíblia, que é uma ótima oportunidade para renovar e fortalecer a sua fé conhecendo mais sobre a Palavra de Deus, pois a Igreja se dedica ao Mês da Bíblia, período no qual as ações que buscam aproximar os fiéis da Palavra de Deus são intensificadas com o objetivo de aprofundar o diálogo criativo entre a Palavra, as comunidades e as pessoas. Em 2024, o Mês da Bíblia será dedicado ao estudo do Livro de Ezequiel, iluminado pelo lema “Porei em vós meu espírito e vivereis” (cf. Ez 37,14). Que a Palavra de Deus seja lâmpada para nossos pés e luz para nossos caminhos!